Costumo dizer que a principal característica dos gênios é saber copiar. E falo isso a partir das minhas experiências, até porque reproduzir é algo que faz parte da cadeia evolutiva. Não dizem que na natureza nada se cria? Em cada região de café não é diferente e eu vou te mostrar a seguir um pouco das particularidades que circulam os cafezais.
No universo do café especial, espaço que sou completamente apaixonado, cada detalhe de cultivo envolve o conceito de vinificação do café. Para comprovar, vamos pegar os fundamentos nascidos na cultura dos vinhedos, há milhares de anos, como terroir.
Os conceitos primários que rodeiam a produção de vinhos são similares aos passos que conduzem os produtores pelas regiões de café especial. O termo vinificação do café especial tem se tornado relevante no universo cafeeiro na última década.
Essa ligação surge com aspectos diversos, como aroma, sabores e potência da bebida. E entre todos esses projetos, entender o conceito de terroir (um termo que ainda causa confusão em muita gente) é fundamental para compreender toda a entrega de um café especial.
Regiões produtoras de café em cada terroir
Em resumo, terroir é um conjunto de características de cada lugar, que engloba microclima, altitude e solo. Esses aspectos interferem diretamente na qualidade do café.
A palavra tem origem francesa e ganhou fama em vinícolas pelo mundo como item prioritário para a plantação de uvas. Tanto que o termo é utilizado como denominação geográfica e rastreabilidade nas regiões de café.
Assim, o objetivo de mostrar peculiaridades de cada terroir se torna uma associação direta ao cultivo do café especial. Sabe o que isso significa na prática? Quer dizer que cada ambiente tem aptidão agrícola para alguma plantação.
Peculiaridades de cada região e reflexo no café especial
Por isso, em certas regiões, temos boas lavouras de café, em outras vinícolas excepcionais de uvas, por exemplo. E no caso dos grãos especiais, a altitude pode influenciar diretamente na qualidade do café. Isso significa que as altas montanhas rendem bons cafés?
Na verdade, o café é feito de uma série de coincidências. Tanto que até as variações de latitude e longitude tem interferência direta no plantio de café. Vou ilustrar tudo isso para ficar mais claro.
Na linha do Equador, a insolação é muito maior. Um produtor que planta café nas altitudes da América Central, com níveis entre 1.500 a 2 mil metros, precisará de esforço extra.
O trabalho de sombreamento na altura é custoso. Mas muito importante para a maturação coordenada das frutas de café. Até porque, meu amigo(a), a insolação por lá é grande, viu? E o sol forte pode torrar as frutas nos pés e, consequentemente, atrapalhar as potencialidades do café.
Plantio em diferentes regiões de café
Esse sombreamento pode ser feito com o plantio de árvores, como abacateiro ou mogno africano que vão proteger a lavoura de café especial do sol. Assim os frutinhos conseguem permanecer maduras por mais tempo agregando mais doçura ainda nas sementes.
O resultado é um café arábica mais adocicado e com excelentes experiências de notas sensoriais. Um retrato de toda essa diferença entre as regiões de café no Brasil é o Pico da Bandeira, região do Alto Caparaó, em Minas Gerais.
O local é o terceiro maior pico do Brasil. Sendo que, de um lado da montanha, você tem uma bebida. Mas do outro nasce um café totalmente diferente. Isso acontece porque de um lado da montanha, você tem o sol nascente e a brisa do mar.
Já do outro lado, o sol poente e não tem brisa do mar. Imagina, estou falando de duas lavouras na mesma altitude, mesma variedade e diferentes cafés. Até porque, cada variedade de café tem uma adaptação a um tipo específico de terroir.
Terroir e o resultado de cafés exóticos
O Geisha, por exemplo, foi descoberto na Etiópia. Contudo, a adaptação ocorreu no alto das montanhas do Panamá, em 2004. O produtor que acreditou na variedade foi Don Pachi.
Ele investiu no plantio com sombreamento, cultivo criterioso, experimentos de fermentação e processo de pós-colheita impecável. Daí, surge a união de coincidências que traz explosão de sabores logo no primeiro gole de café.
Já o café Catuaí é uma “cria” nossa, que se adaptou perfeitamente ao terroir do Brasil. Assim como o Bourbon amarelo e mais um tanto de variedades de café que nascem por todo o país.
O que são notas sensoriais no café especial
Essas peculiaridades podem ser percebidas no paladar a partir das notas sensoriais, que são as características distintas que podem ser identificadas no café especial. Essas características ajudam a definir a complexidade, o significado, terroir e qualidade de cada café especial.
No caso dos grãos de café arábica, essas características têm origem em particularidades, como o terroir, processo de plantio, colheita e pós-colheita. As notas sensoriais exemplificam um pouco desse universo.
Ao provar um café especial é possível identificar notas sensoriais que lembram diferentes sabores, como floral, frutado, nozes, frutas cítricas, mexerica, rapadura, chocolate. A textura da bebida também é outro ponto importante nos cafés especiais 100% arábica.
Outro aspecto importante das notas sensoriais do café especial é a acidez. A acidez pode ser descrita como brilhante, vívida, cítrica ou suave, e pode ajudar a equilibrar a doçura do café.
A Roda dos Sabores e a classificação do café
Para identificar as notas sensoriais do café, os provadores têm técnicas de degustação, que são conduzidas pelo guia internacional chamado de Roda de Sabores. O documento foi idealizado pela Speciality Coffee Association (SCA) em uma representação gráfica.
Na Roda de Sabores os provadores podem identificar e descrever com precisão as características sensoriais presentes em cada amostra de café especial. Esse guia é internacional e, por isso mesmo, utiliza como padrão sabores universais.
Mas eu gosto das brasilidades do nosso país e inventei uma “moda” com o time da Coffee ++, que é uma Roda dos Sabores com sabores e cheiros do Brasil. Mas isso é assunto para o próximo blog.
Semana que vem explico mais sobre esse documento não-oficial [😅] e combino com o pessoal do Festval de enviar aos interessados uma versão da Roda de Sabores brasileirinha para descobrirmos juntos os seus cafés preferidos. Pode ser?
Grande abraço!
Leo Montesanto
Palestrante e fundador da Coffee ++, marca brasileira que nasceu com o compromisso de deixar no Brasil o café de qualidade que sempre foi exportado. Leo faz parte da terceira geração da família à frente no mercado cafeeiro e é um entusiasta do plantio do café especial. Em 2018, ele ganhou o título de café mais pontuado do mundo durante o Cup of Excellence (principal campeonato de qualidade para produtores do mundo) com a variedade Geisha, que é a bebida oficial do Palácio Imperial Japonês.